O jornalista Fernando Calmon que escreve a coluna Alta Roda explica como é feito o preço para a venda de um veículo.
Os preços dos carros no País são influenciados – de forma permanente – por três fatores: impostos, Custo Brasil (visível e invisível) e as variações cambiais. Mas há gente que prefere atribuir os altos preços, em artigos pela internet, apenas ao Lucro Brasil.
O que é custo invisível? Entre vários outros, estradas em petição de miséria. São as mais caras do mundo, recolhem pedágio para os bolsos errados mesmo sem as cancelas e encarecem os carros com reforços estruturais e elevação da altura de rodagem, o que aumenta o arrasto aerodinâmico, o consumo de combustível e as emissões.
Comparar, porém, custos visíveis exige uma moeda de conversão, dólar ou euro. Anote essas diferenças:
a) Custo total de produção de veículos no Brasil: 60% maior que a China e 33% superior ao México.
d) Hora da mão de obra com ônus diretos e indiretos: 340% superior à Índia e China; 104% mais cara que o México.
e) Água industrial: 97% mais alto que o México; 900% mais cara que na Argentina.
A fonte é a empresa internacional de consultoria PricewaterhouseCoopers, estudo de 2010. Claro, sempre a “maioria” vai achar que o Lucro Brasil anula tudo isso com folga. Mas não provam, porque lucro é a diferença entre preço (possível) de venda e os custos, abatidos os impostos.
Aliás, muitos aqui adoram a teoria da conspiração. Balanço financeiro que mostra lucro elevado só pode ser exploração do povo, não importando se a empresa perdeu dinheiro no passado. Se revelou prejuízo, deve ter sido fraudado para esconder o lucro.
Vamos à discussão cambial. O real não é moeda conversível. Então é preciso eleger o dólar como referência, utilizado nas transações e comparações no mundo. Suponha que a moeda americana valesse R$ 3,00 e não R$ 1,55 como agora (já esteve em quase R$ 4 no final de 2002). Um Mille custaria US$ 7.333,33 com toda a carga fiscal brasileira. O carro mais barato nos EUA começa em torno de $12.000 (lá o frete é cobrado à parte). Mas se enfrentasse a mesma carga fiscal direta brasileira custaria US$16.000, no mínimo.
Em matérias jornalísticas é comum informar preços em reais no exterior, mas o cálculo sempre tem que passar pelo dólar. Pode-se comparar o Corolla nos EUA e no Brasil, quase iguais. No câmbio atual, o americano custa R$ 28.000 e o brasileiro, R$ 67.000. Chocante, mas se o dólar estivesse, como em dezembro de 2008, a R$ 2,53, o Corolla americano valeria R$ 45.000 e a R$ 3,00, R$ 54.000. E mais, igualados os tributos, o Corolla de lá sairia mais caro que o daqui, apenas pelo efeito cambial, esvaziando essa discussão meio tola.
Fator Big Mac (moeda fictícia FBM$). O Big Mac custa aqui R$ 9,50. Nos EUA, US$ 3,49 mais 8,25% de imposto ou US$ 3,78. Para comprar o carro mais barato lá, o americano gastaria o equivalente a FBM$ 3.174 e no Brasil, FBM$ 2.315. Por esse critério neutro, um automóvel de entrada é mais barato no Brasil do que nos EUA.
Obviamente não estou comparando equipamentos nos veículos e sim a capacidade do cidadão se motorizar. Quem discordar, escreva uma carta para Pitágoras no Além. Criador da matemática, ele se foi desse mundo em 497 a.C.
E quanto aos impostos incidentes sobre veículos no Brasil estudo feito em 2007 (com dólar menos desvalorizado) por uma consultoria especializada em comércio exterior, resume: um carro que chega aos portos brasileiros por US$ 10.000, por exemplo, aparece nas lojas por US$ 30.571 depois de todos os impostos, custos e margens.
FORMAÇÃO DE PREÇOS DE VEÍCULOS IMPORTADOS | |||||
IMPORTAÇÃO DIRETA | |||||
CUSTO DOS PRODUTOS IMPORTADOS | % | % | |||
CUSTO DE AQUISIÇÃO | |||||
- FOB | US$ | 10.000 | |||
- Frete marítimo | US$ | 700 | |||
- Seguro | 0,16% | 17 | |||
- CIF | US$ | 10.717 | 100,00 | 35,06 | |
CUSTO DE IMPORTAÇÃO | |||||
- Imposto de importação | 35% | 3.751 | 35,00 | 12,27 | |
- IPI | 25% | 3.617 | 33,75 | 11,83 | |
- ICMS | 12% | 2.466 | 23,01 | 8,07 | |
- Marinha mercante | 25% | 175 | 1,63 | 0,57 | |
- Custo de despachante | US$ | 100 | 0,93 | 0,33 | |
- Armazenagem para desembaraço | 0,25% | 54 | 0,50 | 0,18 | |
- Movimentação no porto | US$ | 50 | 0,47 | 0,16 | |
- Outros custos de operação * | US$ | 100 | 0,93 | 0,33 | |
CUSTO LOGÍSTICO | |||||
- Frete para armazenagem | US$ | 250 | 2,33 | 0,82 | |
- Preparação para venda | US$ | 150 | 1,40 | 0,49 | |
- Frete para distribuição | US$ | 250 | 2,33 | 0,82 | |
CUSTO PARA COMERCIALIZAÇÃO | |||||
- Margem do importador | 9% | 900 | 8,40 | 2,94 | |
- IPI s/ margem | 25% | 225 | 2,10 | 0,74 | |
- ICMS s/ margem | 12% | 108 | 1,01 | 0,35 | |
- ICMS substituto | 12% | 489 | 4,56 | 1,60 | |
- PIS/Cofins monofásico | 8,26% | 1.351 | 12,61 | 4,42 | |
- Margem do concessionário | 11,45% | 3.500 | 32,66 | 11,45 | |
CUSTOS OPERACIONAIS | |||||
- Marketing | US$ | 800 | 7,46 | 2,62 | |
- Custo Financeiro | US$ | 150 | 1,40 | 0,49 | |
- IR / Contribuição Social*** | 34% | -731 | -6,82 | -2,39 | |
- Despesas Gerais ** | US$ | 2.000 | 18,66 | 6,54 | |
- CPMF | 0,38% | 99 | 0,92 | 0,32 | |
PREÇO DE VENDA CONSUMIDOR | US$ | 30.571 | 285,25% | 100,00% | |
* Custo relativos a OGMO, Taxa SISCOMEX, Registros, etc. | |||||
** Folha de Pagamento e Despesas Administrativas | |||||
*** IR / Contribuição Social negativo significa prejuízos operacionais | |||||
Carga Tributária Total (Sem Encargos Trabalhistas ) | US$ | 12.106 | 112,96% | 39,60% |
Leia também a Coluna Alta Roda da semana passada: Levo dois
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